Trajetória

Nosso dirigente, Ivo de Cavalho contando sua trajetória na Umbanda. Lindo vê-lo com tanta energia aos seus 82 anos de idade. 

Como não nos sentirmos orgulhosos de tê-lo como pai. Cada palavra um aprendizado, cada ponto uma oração. Entrevista realizada por Alex do Grupo de Estudo Braulio Goffman. 

 

Pai de Santo

Ser um Babalorixá é ser como Ivo de Carvalho, nosso Pai no Santo como ele gosta de dizer. 

Pai de Santo é a tradução literal de Babalorixá.

 

 

Este slideshow necessita de JavaScript.

 

SER PAI DE SANTO*
(autor desconhecido)

Ser Pai de Santo é viver mil vezes em apenas uma vida, é lutar por causas perdidas, é desconhecer a palavra recompensa apesar dos seus atos.

Ser Pai de Santo é caminhar na dúvida cheio de certezas, é correr atrás das nuvens num dia de sol e alcançar o sol num dia de chuva.

Ser Pai de Santo é chorar de alegria e muitas vezes sorrir com tristeza, é cancelar sonhos em prol de terceiros, é acreditar quando ninguém mais acredita, é esperar quando ninguém mais espera.

Ser Pai de Santo é identificar um sorriso triste em uma lágrima falsa, é ser enganado e sempre dar mais uma chance, é cair no fundo do poço e emergir sem ajuda.

Ser Pai de Santo é se perder em palavras e depois perceber que se encontrou nelas, é distribuir emoções que nem sempre são captadas.

Ser Pai de Santo é construir castelos na areia, vê-los desmoronados pelas águas e ainda assim construir outros.

Ser Pai de Santo é tentar recuperar o irrecuperável, é entender o que ninguém mais conseguiu desvendar.

Ser Pai de Santo é estender a mão a quem ainda não pediu, é doar o que ainda não foi solicitado.

Ser Pai de Santo é ter a arrogância de viver apesar dos dissabores, das desilusões, das traições e das decepções.

Ser Pai de Santo é ser pai dos filhos dos outros e muitas vezes não ser dos seus, é amar igualmente e nem sempre ser amado.

Ser Pai de Santo é ter confiança no amanhã e aceitação pelo ontem, é desbravar caminhos difíceis em instantes inoportunos e fincar a bandeira da conquista em meio à derrota.

Ser Pai de Santo é entender as fases da lua por ter suas própria fases. É ser “nova” quando o coração está a espera de filhos de Santo, ser “crescente” quando estes filhos batem a sua porta, ser “cheia” quando já não cabe tantos filhos no Ilê e “minguante” quando muitos desses filhos vão embora cortando seu coração ao meio com injurias e falsas palavras.

Ser Pai de Santo é voltar no tempo todos os dias e viver por poucos instantes coisas que nunca ficarão esquecidas.

Ser Pai de Santo é cicatrizar feridas de outros e inúmeras vezes deixar as suas próprias feridas sangrando e doendo.

Ser Pai de Santo é chorar calado as dores de todo mundo e em apenas um segundo estar sorrindo.

Ser Pai de Santo é subir degraus e se os tiver que descer não precisar de ajuda, é tropeçar, cair e voltar a andar sozinho.

Ser Pai de Santo é acima de tudo um estado de espírito, é ter dentro de si um grande tesouro escondido chamado FÉ e ainda assim dividi-lo com o mundo, mesmo que o mundo não mereça, sem esperar nada em troca!

* Pai de Santo neste texto se refere a todos os Sacerdotes e Sacerdotisas dos cultos e religiões afro-brasileiras e de matriz africana.

7 coisas que você só descobre depois de se tornar Umbandista

1 – Usar branco não é fácil.

Pode parecer que é fácil, mas não é. 
Essa cor traz uma responsabilidade enorme. Você terá que aprender a vigiar seus atos, zelar pelo seu espiritual e entender que há irmãos que precisam, naquele momento, mais do que você. Então, você trocará festas, shows, amigos, bebidas e um dia de descanso, para se doar algumas horas para uma pessoa que você nunca viu e provavelmente nunca mais vai ver, mas posso te garantir, vale a pena.

2 – Você é um médium 24 horas por dia e não só no terreiro.

Não adianta você se enganar dizendo que é médium só no terreiro porque você não é. A mediunidade faz parte de você, sempre fez, e isso não vai mudar. Aos poucos você vai descobrir isso e entender que a espiritualidade não é culpada pela sua colheita. Eles te mostram um caminho, mas você tem um livre arbítrio e realiza suas próprias escolhas. Você planta, você colhe.

3 – As entidades não estão ali de brincadeira.

Nenhuma entidade está ali de brincadeira. Todas elas, sem exceção, estão ali para trabalhar, ensinar e também aprender, por isso, ouça-os com atenção e trate-os com muito carinho e respeito.

4 – Exu é uma entidade de Lei.

Você vai entender que Exu não esta ali para brincar, beber, fumar, dar em cima de alguém ou amarrar uma pessoa. Não. Eles não são assim. Exus e Pombo Giras são entidades que trabalham nos planos inferiores sob a Lei do Pai Maior. São eles que nos protegem na entrada, na saída e nas encruzilhadas dessa vida. Alguns são brincalhões outros mais firmes, mas todos carregam consigo a seriedade em seu trabalho, se utilizando somente da energia da bebida e do fumo, nada mais. E se for preciso Exu trabalhar sem a bebida ou o fumo, ele trabalhará, sem dúvidas.

5 – É preciso ajudar e não só participar.

Ser médium e fazer parte de um terreiro não é só chegar no dia da Gira e fazer seu trabalho. Não. Não é assim. 
O chão que você encontrou limpo, alguém limpou. A vela que você usou, alguém comprou. O banho que você tomou, alguém macerou. O local que você está, a luz que você utiliza e a água que você bebe, alguém pagou. Então, ajude… 
Ajude a limpar quando puder, leve o seu material de trabalho e, toda vez que possível, auxilie na compra daquilo que falta na Casa, colabore com o que conseguir para a manutenção do aluguel, da água e da luz. Não. Isso não é sua obrigação, eu sei, mas também não é minha e nem do Dirigente que ali se encontra. A obrigação é nossa. Nós temos que manter e cuidar do lugar onde nossa espiritualidade escolheu para trabalhar.

6 – Cansa.

Isso eu preciso te falar: Irmão, cansa. Existe um antes, durante e depois, vou explicar:
ANTES de todo e qualquer trabalho, o terreiro precisa ser limpo da maneira correta e as firmezas precisam ser devidamente cuidadas.  Você precisará se alimentar de maneira correta, tomar seu banho de defesa, acender suas velas e se direcionar ao terreiro, algumas horas antes do inicio dos trabalhos, para ajudar, tentando permanecer sempre em silêncio.
DURANTE todo e qualquer trabalho, você estará fornecendo e recebendo energias, então, é importante que o processo do ANTES tenha sido cumprido com rigor. Se você for médium de passe, lidará diretamente com energias. Se você for cambono, também lidará diretamente com energias, por isso, em todos os casos e cargos, é importante manter a firmeza.
DEPOIS de todo e qualquer trabalho, é preciso deixar o ambiente limpo de novo, então, pegue a vassoura, a pá, a esponja e mãos a obra. Dia seguinte você com certeza estará com o corpo dolorido, entretanto, digo mais uma vez a você: vale a pena.

7 – Você vai se apaixonar.

Independentemente dos 6 itens acima, você vai se apaixonar. Seja você um cambono, um médium de passe, um médium em desenvolvimento, um futuro sacerdote ou um simples consulente, esteja você na corrente ou na assistência, você vai se apaixonar por essa religião e nada, NADA, vai pagar a sensação de paz que vai te invadir ao receber um abraço sincero de alguém que você nunca viu, ao ver um sorriso no rosto de quem chegou chorando, ao ouvir o mais simples e sincero “obrigado”… Nada vai pagar.

Este slideshow necessita de JavaScript.

 

Oxum, a padroeira

Por Sid Soares

Dia 12 de outubro, dia de Senhora Aparecida a protetora do Brasil e para nós de Umbanda, um dia consagrado a mãe Oxum, a senhora agregadora, mãe da fertilidade, do ouro e do amor.

Nossa Mãe Oxum é sincretizada com Nossa Senhora Aparecida por vários motivos, as duas são negras e surgiram das águas, uma no rio Paraíba e outra no rio oshun na Nigéria. Ambas são mães da fartura, a Padroeira foi encontrada no rio por pescadores que não conseguiam sucesso, tentavam a todo custo encontrar peixes nas águas e acharam em sua rede o corpo de uma santa e não desistindo encontraram logo depois a cabeça que emergia das águas com uma quantidade enorme de peixes. Isso já nos mostra o quão importante é seguir, continuar sempre e descobrindo meios de desviar, assim como o rio, sem desistir!

Oxum é mãe da fartura assim como farta foi a pesca dos devotos que encontraram a imagem, e muitos só acreditam que essa Iabá é apenas a mãe do ouro e da riqueza em relação aos bens materiais. É sim, mas por quê? Por que onde há Amor tudo prospera, tudo vinga e floresce. Se uma relação é escassa de amor, ela não dura. Se uma empresa não tem o olhar amoroso de quem a lidera ou as mãos gratas dos que ali trabalham, amando o que faz, ela não se sustenta.

O ouro de Oxum é esse, o amor. É a vibração divina do amor, ou seja, a manifestação do amor de Deus por nós se chama Oxum, assim como Maria é a Mãe que chorando a perda de seu Filho, assumiu toda a humanidade em seu ventre.

É errado ser devoto de Oxum e Senhora Aparecida? Não! Todos nós precisamos de mães, somos falhos e vivemos engatinhando pelos caminhos da vida ou tropeçando pelas estradas das emoções e por isso precisamos delas, as mães e de muitas. Mães que continuem conosco quando as nossas vão embora, pois infelizmente, elas vão.

Aparecida é a negra que entendia a dor dos escravos, dos sem rumo e que falava fundo aos mais simples. Oxum é a mãe dos rios e águas doces, dos sentimentos e da fertilidade e não por acaso as duas coisas são mais comuns do que parece! É pelos sentimentos que secamos ou damos frutos, quantas vezes deixamos as mágoas ou decepções secarem nossos sonhos? Quantas vezes renascemos mais fortes como um rio vivo e limpo ao nos sentirmos amados de verdade? E o que sai de nós para o outro é também responsável por tudo que seca ou brota em nossas vidas, se somos mesquinhos nossa vida é também pequena. Se usarmos da piedade para tirar proveito do outro, nada do que conquistamos se mantém.

Oxum chora? Chora sim! Por nossas atitudes equivocadas e Zambi sabe o quanto ainda iremos nos enganar. Mas chora também mostrando o quanto é importante percebermos que somos humanos, precisamos sim chorar, pois não podemos segurar tudo e às vezes a correnteza do rio é muito forte para que nosso barco frágil dê conta de seguir, assumir cansaço não é sinal de fraqueza, mas antes conhecer suas limitações, e não devemos ter medo de sentar a margem desse rio, ou no colo da mãe e descansar.

Mas tão logo possa, coloque seu barco no curso do rio novamente, amar, frutificar e seguir faz parte da vida!

Obrigações dentro do Ritual da Umbanda

Mais uma Conversa de Terreiro com nosso babalorixá Ivo de Cavalho sobre a caminha espiritual do médium dentro do terreiro e as obrigações que o mesmo deve cumprir até chegar ao grau maior de médium coroado.

 

A vida obedece ao Tempo – Sid Soares

Já parou para pensar que tudo na vida obedece ao Tempo, aos dias e anos, e essa força cronológica que o Universo exerce sobre nós é percebido em nossos cabelos quando ficam brancos, em nosso olhar a cada dia mais cansado, e em nosso corpo que passa a caminhar mais lentamente e por vezes arrastado?

Nossa vida, voz, corpo e órgãos envelhecem, mas e nossas emoções? Que curso tomam na estrada do tempo? Não, elas são a única coisa que não obedecem ao peso dos dias. Apenas as emoçoes e sentimentos perduram firmes e seguras transitando entre nós, dançando conosco todos os dias.

Na verdade, são as emoçoes que nos envelhecem ou nos torna jovens, é o peso das mágoas, do rancor e dos medos, é a insatisfação do que não se fez que empurra para baixo os nossos ombros, porque os braços que não trabalham em compasso com o que sonha o coração e nem com o que imagina a mente, se torna atrofiado para o propósito que foi criado. Assim envelhecem o coração, a mente e também os olhos, já que o objetivo deles é justamente enxergar aquilo que o coração quer e que os braços e as mãos ainda não criaram.

Mas também são as emoções que nos mantém jovens e mais que isso, vivos! Embora os anos, preocupações e dúvidas nos marquem o semblante, é a fé, a coragem e o amor o combustível da vida, são esses sentimentos as horas e os minutos do Tempo, que tem como ponteiros os nossos sonhos.

São as nossas esperanças em realizá-los que mantém ereta nossa coluna, nossos olhos brilhantes e o nosso sorriso farto e simples. Os sonhos podem não ter ainda alcançado as nossas mãos mas quando os temos no coração elas, as nossas mãos não cessam de buscá-los!

Mais textos do autor clic Sid Soares

 

Caboclo Pena Branca

Aldeia do Caboclo Pena Branca

Palavras do nosso dirigente:

Em junho de 1985 fui agraciado com uma intuição para escrever a letra da cantiga do Caboclo Pena Branca.

Participação especial do Ogã Jorge Coelho

Gostaria de esclarecer que TODOS os pontos de Ivo de Carvalho são registrados. Eles podem ser cantados nos terreiros, nos centos, nas tendas, nos eventos de Umbanda, mas para comercializá-los só com a permissão do autor.

Letra do Ponto

Que lindo brado eu ouvi naquela aldeia
Naquela aldeia numa noite de luar
Era um caboclo que vinha chegando
Com sua flecha, seu bodoque e seu cocar

Que lindo brado eu ouvi naquela aldeia
Naquela aldeia numa noite de luar
Era um caboclo que vinha chegando
Com sua flecha, seu bodoque e seu cocar

Mas ele veio no clarão da lua
Iluminado por pai Oxalá
Ele é caboclo
Ele é guerreiro
Ele seu Pena Branca
Ele é o rei do Panaiá

 

“Eu vim lá de Angola, eu vim lá do meu congá”

Nós Negros e Negras brasileiras não devíamos esquecer essa data não, como alguns pretendem. Para mim, essa é a data mais importante, pois revela e diz que a LUTA deles NUNCA fora em vão e como diz meu amigo Wallace Lopez Espaçólogo, ainda vivemos o 14 de maio de 1988 até hoje. 

Segue o texto de Sid Soares para reflexão. Um belo texto.

Libertação
Me foi dito por uma entidade chamada Rosa, a quem eu muito agradeço os ensinamentos e mensagens que têm me trazido, que os navios negreiros agora são outros, e também são outros os quilombos onde buscamos nos refugiar e com isso, sem o entendimento das mudanças que nos cercam, na visão espiritual nós no plano físico corremos desesperados de um lado para o outro.

Cada um se refugiando em um esconderijo, um abrigo que a bússola da alma orienta. Segundo ela, o problema é a bússola e num momento onde vemos pessoas deixando pra trás suas casas, cidades e países, nós também somos refugiados, deixando pra trás nossa essência, nossa fortaleza, nossa esperança.

Os agentes divinos da Lei Maior estão trabalhando sem parar para acelerar o processo de evolução dos povos e nações, apressando processos de reencarnação e transmigração espiritual, clareando as mentes e os corações da humanidade e enquanto isso uma gama enorme de espíritos ligados a linha das almas, ou Yofá operam em nosso entendimento, nossos corpos mais sutis, fortalecendo nossa busca pela transformação do ser.

Mesmo que toda a sabedoria faça parte da mente humana, se faz necessário a orientação bondosa e serena de um preto velho, que visa libertar os filhos das encruzilhadas da alma. O cruzeiro ou madeiro, que é o símbolo da iluminação dos homens ultrapassando as esferas possíveis e nos guiando rumo ao impossível brilha hoje sobre o planeta como farol divino, mostrando as almas a direção do Bem.

Ainda que a violência nos assalte, seja na rua, em nossa casa ou mesmo dentro nós quando somos cruéis com nossos sonhos, o 13 de maio é um marco que se apresenta para todos na figura bondosa do preto velho ou preta velha que trabalhando, fazem mais que aconselhar, benzer, rezar…nos educam para a vida, para a nova vida. Não devemos confundir o olhar e a fala apaziguadora deles com uma subserviência humilhante, mas antes perceber que essa energia que recebemos deles é a energia do entendimento, da compreensão e da luta e perseverança pelo que é correto.

Onde houver e enquanto houver num 13 de maio uma oração, uma vela ou um copo d’água, onde houver um rosário ou um canto em louvor as almas e a essa Coroa Ancestral, por certo haverá também uma corrente luminosa ligando os planos da vida em favor do Bem Maior e do Mundo, haverá essa conexão entre a sabedoria e a persistência nos mostrando um caminho.

Nessa data onde os cruzeiros de todo o país se iluminam, os pretos velhos rogam a transformação dos filhos, do entendimento dos filhos. Oram pelo que ainda nos impede a caminhada, e somam forças pela liberdade dos povos começando pelos nossos olhos e corações pois como eles mesmo dizem: Só compreenderemos o sentido e a importância de liberdade quando enxergarmos de fato qual é a nossa prisão.

Rosa ainda me deixou duas perguntas libertadoras: Do que você tem fugido? Onde você tem se refugiado?